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Telemedicina: cenário, desafio e perspectivas

Telemedicina: cenário, desafio e perspectivas

Preciso de um médico! Talvez esta expressão nunca tenha feito mais sentido do que agora, em tempos de pandemia. Uma das respostas adotadas no país para ampliar a capacidade de atendimento da população foi a adoção da telemedicina, uma prática já difundida em diversos países, mas que começa uma abertura efetiva no Brasil em 2020.

Em 23 de março deste ano, o Ministério da Saúde publicou a Portaria nº 467, com o objetivo de regulamentar e operacionalizar as medidas de enfrentamento da emergência de saúde pública que é o COVID-19. Assim, o documento permite, em caráter temporário e excepcional, o uso da telemedicina entre profissionais e usuários do Sistema Único de Saúde (SUS), da saúde suplementar e privada.

Em outras palavras, está permitida a interação a distância entre profissionais e pacientes. Dessa forma, será possível realizar atendimentos clínicos de monitoramento e diagnóstico, por meio de tecnologia da informação e comunicação. A liberação de atendimentos não presenciais é válida enquanto durar a situação de emergência em saúde pública. Nesse período, os médicos poderão emitir atestados ou receitas médicas em meio eletrônico, usando assinatura eletrônica.

A medida leva em consideração a Resolução nº 1.643/2002 do Conselho Federal de Medicina (CFM) e o Ofício CFM nº 1756/2020-Cojur, de 19 de março de 2020, que reconhece a possibilidade e a ética do uso da telemedicina em caráter emergencial e temporário.

De todas as modalidades mediadas, a mais polêmica é a teleconsulta, quando paciente e médico estão em diferentes espaços. Este cenário poderia gerar insegurança por tocar em aspectos fundamentais da relação médico-paciente. Contudo, a tecnologia vem se desenvolvendo rapidamente e as plataformas de comunicação estão cada vez mais eficazes, entrando de vez na vida das pessoas, o que deverá facilitar a adoção da teleconsulta.

Entre os benefícios da teleconsulta destaca-se primeiro a não necessidade de deslocamentos. Esse aspecto ganha maior importância para pessoas com mobilidade reduzida, debilitados ou que vivem em pequenas cidades no interior, longe das unidades de referência. Essas pessoas deixariam de precisar percorrer grandes distâncias para conversar com um especialista, por exemplo.

Outro benefício é o aumento da acessibilidade à saúde, uma vez que este formato democratiza o serviço, possibilitando o atendimento em várias cidades, o que também ajudaria na distribuição de médicos pelas regiões.

A telemedicina também promove a melhora na qualidade do atendimento. Muitas vezes um lugar tem atendimento médico, mas poucos profissionais especializados. Com uma teleconsulta ou mesmo uma teleconsultoria, consegue-se esse atendimento especializado ou o suporte de um especialista na resolução de um caso, tudo sem demandar maiores deslocamentos.

Para as empresas de saúde há ainda a perspectiva da redução de custos com a implementação da tecnologia, principalmente aqueles ligados ao deslocamento de médicos entre cidades e todos os gastos relacionados. Além disso, a tecnologia permite a discussão de vários profissionais em um mesmo caso, aumentando o foco no paciente.

Mitos derrubados

Carlos Marinelli, CEO do Grupo Fleury, conta em recente artigo publicado no Brazil Journal (Três mitos da saúde que a pandemia derrubou) que a “economia que emerge da experiência de isolamento social, chamada de low touch economy, une tecnologia e distanciamento físico, e será o ‘novo normal’ daqui para frente”.

Ele explica que as empresas do setor de saúde passaram a ter essa necessidade de digitalização ainda mais urgente, obrigando-as a se adaptar o quanto antes à nova realidade. Mitos antes apontados como obstáculo para a telemedicina, estão caindo por terra diante das necessidades de adaptação imposta às pessoas durante a pandemia.

O primeiro deles é o de que a relação médico-paciente deveria ser presencial. O medo da lotação de prontos-socorros e hospitais fez autorizar a telemedicina e os bons resultados demonstraram que a iniciativa promove acesso à saúde, gerando conveniência para médicos e pacientes.

Outro mito desfeito, segundo Marinelli, é o que de pessoas idosas têm dificuldade com nova tecnologias. O sucesso das lives de famosos, reuniões de família on-line e adoção da comunicação online instantânea puseram aplicativos como WhatsApp, Zoom e Spotify de vez na tela inicial dos smartphones da geração da terceira idade.

O terceiro fator mencionado no artigo é o de que as pessoas não valorizam a prevenção à saúde. Com esta pandemia, o assunto veio para o centro das atenções e buscar uma vida mais equilibrada e saudável passou a estar no dia a dia de pessoas e incentivada pelas empresas.

Empresas de APH precisam se preparar

Uma das áreas da saúde atenta a esse movimento é a de atendimento pré-hospitalar (APH). Com atuação marcante em urgências e emergências, realizando atendimento onde e quando o cliente mais precisa, as empresas deste segmento precisam saber se adequar e manter sua relevância em um cenário de serviços de saúde prestados à distância.

Bruno Mello, especialista em gestão estratégica, e consultor de diversas empresas do segmento de saúde, conta que a aplicabilidade da telemedicina cerca o ambiente de negócios do APH desde sua origem. “Seja por deixar nebulosa a amplitude da abrangência dos processos intrínsecos ao atendimento quando há interação médica mediada por tecnologia ou porque a ameaça da adesão da telemedicina por parte dos demais segmentos da saúde, sempre paira uma dúvida sobre o impacto no ambiente de negócios do segmento de APH”, esclarece Mello, um dos sócios da Brava Consulting, empresa com experiência no atendimento de empresa deste segmento da saúde.

A tendência é que quando o mercado começar a ter atendimento rápido e facilitado com um médico, mesmo que à distância, e isso representar a satisfação de acesso rápido e cômodo a serviços de saúde, a dinâmica de valor de mercado irá se alterar entre os competidores de diferentes segmentos da saúde.

Porém, mesmo diante de um cenário de grandes desafios, Mello enxerga oportunidades para as empresas de APH. “A utilização de recursos de tecnologia e comunicação norteiam o modo como a sociedade vive e é uma realidade cada vez mais presente na área da saúde. Neste contexto, a telemedicina deve ser encarda pela empresas de APH sob a ótica das oportunidades que pode gerar, entre elas a possibilidade de implementar melhorias que alavanquem redução de custo, e a chance de explorar uma nova vertente de mercado sem incremento real de estrutura”, finaliza Mello, destacando a oportunidade de melhorar o produto “atendimento” conceitualmente, maximizando valor para o cliente, que pode ter o serviço contratado mais próximo de si.